b) Em caso de flagrante delito -
O flagrante delito também afasta o crime de invasão de domicílio. Mas é
preciso saber o que é flagrante delito (Artigos 302 e 303 do Código de
Processo Penal)
Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem:
I - está cometendo a infração penal;
II - acaba de cometê-la;
III
- é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por
qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;
IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.
Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência.
Alguns
doutrinadores entendem que só cabe a entrada em domicílio em caso de
flagrante delito no flagrante direto, que é quando está acontecendo o
crime (art. 302, inciso I). Tal entendimento se dá em razão do disposto
no artigo 150, § 3º, inciso II, do Código Penal, que diz que não
constitui crime a entrada ou permanência em casa alheia, a qualquer hora
do dia ou da noite, quando algum delito está sendo ali praticado ou na
iminência de o ser. Os outros casos de flagrante delito não foram
contemplados por este artigo. Entretanto, há de se esclarecer que a
Constituição Federal (art. 5º, inciso XI) não faz distinção; ela diz que
é permitida a entrada em casa alheia em caso de flagrante delito, não
mencionando se é apenas no flagrante direto.
O
artigo 294 do Código de Processo Penal prescreve que se deve observar,
em caso de flagrante delito, o disposto no artigo 293, no que for
aplicável.
Art.
293. Se o executor do mandado verificar, com segurança, que o réu
entrou ou se encontra em alguma casa, o morador será intimado a
entregá-lo, à vista da ordem de prisão. Se não for obedecido
imediatamente, o executor convocará duas testemunhas e, sendo dia,
entrará à força na casa, arrombando as portas, se preciso; sendo noite, o
executor, depois da intimação ao morador, se não for atendido, fará
guardar todas as saídas, tornando a casa incomunicável, e, logo que
amanheça, arrombará as portas e efetuará a prisão.
Parágrafo único. O
morador que se recusar a entregar o réu oculto em sua casa será levado à
presença da autoridade, para que se proceda contra ele como for de
direito.
Art. 294. No caso de prisão em flagrante, observar-se-á o disposto no artigo anterior, no que for aplicável.
c) Num desastre, para prestar socorro -
Situação que também autoriza a entrada em domicílio, haja vista que o
bem maior a ser protegido é a vida. É prevista pela Constituição
Federal.
d) Por determinação judicial, durante o dia -
Esta situação cabe tanto em caso de busca e apreensão como em caso de
prisão decorrente de mandado. É preciso observar o modo de proceder a
entrada no domicílio, conforme dispositivos legais indicados acima.
f) Estado de necessidade -
É uma excludente de ilicitude, prevista pelo artigo 23 do Código Penal.
Um exemplo dessa situação pode ocorrer quando, durante uma troca de
tiros, o policial adentra numa casa para se abrigar.
Código Penal
Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:
I - em estado de necessidade;
II - em legítima defesa;
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
Art.
24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para
salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de
outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas
circunstâncias, não era razoável exigir-se.
g) Estrito cumprimento do dever legal associado à circunstância que torna ou tornaria a ação policial legítima -
Essa possibilidade de entrada em domicílio é muito pouco falada.
Encontra previsão legal no Código Penal, numa combinação dos artigos 23,
inciso III, e 20, § 1º.
Código Penal
Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:
I - em estado de necessidade;
II - em legítima defesa;
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
Artigo
20, § 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas
circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a
ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o
fato é punível como crime culposo.
Dou alguns exemplo dessa possibilidade.
Durante
patrulhamento a pé num logradouro público, um cidadão, desesperado,
informa a uma dupla de policiais que um homem está tentando matar uma
mulher dentro de uma casa. Os policiais se aproximam da casa e ouvem
gritos de socorro. Pensam: "Entrar ou não entrar?". Em vista do dever de
proteger a sociedade, mesmo com o sacrifício da própria vida, decidem
entrar e, para surpresa, constatam que tudo não passou de um grande
equívoco, pois na casa estava acontecendo um ensaio de uma peça de
teatro, e o cidadão que lhes informou sobre o fato era um portador de
enfermidade mental.
Uma
equipe de policiais do Tático Móvel recebem informações de que um
indivíduo estaria cultivando pés de maconha num apartamento. Ao chegar
nas próximidades do prédio, avistam, na janela do apartamento do
suspeito, um vaso contendo uma planta de formato e cor semelhantes a um
pé de maconha. O suspeito, vendo as viaturas policiais, começa a
destruir a planta. As circunstâncias descritas evidenciam a veracidade
da denúncia, razão pela qual os policiais adentram no apartamento e
encontram 02 (dois) pés de uma planta semelhante à maconha.
No
segundo caso, mesmo se a denúncia não fosse confirmada, os policiais
não teriam cometido nenhum ilícito, pois agiram no estrito cumprimento
do dever legal em vista de circunstâncias plenamente justificáveis,
baseadas em fundadas suspeitas, que, se confirmadas, tornariam a ação
legítima.
O
Direito constitucional de inviolabilidade domiciliar não se estende a
lares desvirtuados, como casas de tolerância, locais ou pontos de
comércio clandestino de drogas ou de aparelhos subversivos, cassinos
clandestinos, etc. A casa é asilo inviolável do cidadão, enquanto
respeitadas suas finalidades precípuas de recesso do lar, pois,
desvirtuado esse sentido domiciliar, pelo seu mau uso, deixa de merecer a
tutela constitucional e mesmo a penal.
Dessa
forma, quem emprega a própria casa para para fazer dela instrumento
para acobertar, praticar ou facilitar o cometimento de delitos, não terá
a tutela constitucional protetiva inerente ao domicílio, que por certo
não está à disposição do crime.