30 de novembro de 2014

Brecha para a legalização ambiental e/ou mineral é correto?


Este artigo é uma adaptação feita por um escrito do analista ambiental Fernando J. Soares sob o título "Crítica à lógica da ignorância desenvolvimentista na construção do mito da demora", com arranjo para nossa realidade:

Há muito tempo que as reclamações diversas se espraiaram para o âmbito do licenciamento ambiental/mineral municipal na seara itaitubense.


Já o chamaram antes de demorado, caro, complicado, burocrático, mas agora o termo da vez é refratário. Para a maioria, o licenciamento ambiental/mineral é, na verdade, um porre.

Tem-se a impressão de que se o empreendedor e o próprio poder público pudessem fugir do licenciamento ambiental/mineral usando quaisquer meios que fossem possíveis, o fariam.Como não dá para escapar do licenciamento ambiental/mineral como um todo, então se tenta evitar ao menos o licenciamento ambiental estadual, através da famigerada SEMA, fragmentando o empreendimento em empreendimentos menorzinhos que poderiam se encaixar no porte previsto pelas resoluções do COEMA, como sendo licenciamento de âmbito municipal – prática esta que vai além dos interesses do licenciamento.
Já o município, sob a guarda dos princípios constitucionais, ainda que evite o auto licenciamento a seu modo, também fará tudo que estiver ao seu alcance para que o licenciamento de suas obras seja por ele conduzido, evitando o licenciamento ambiental/mineral estadual.

É claro que no município tudo fica mais fácil, mais próximo, mais influenciável. E isso não é ruim. É no município que a realidade acontece. É seu o conhecimento específico da geografia, das condições sociais e econômicas, das suas necessidades e de seus recursos. O quadro funcional técnico do Estado não está próximo o suficiente das mazelas locais. Mas há, sim, um lado negativo. Enquanto alguns municípios ainda vêm se adequando ao compromisso com a Lei Complementar 140/2010 e ao disposto na Resolução COEMA 116/2014, outros mais experientes e na contramão das políticas de proteção ao bem comum, talvez cansados da choradeira, vêm desmantelando suas equipes técnicas de profissionais comprometidos, na justificativa de dar mais fluidez aos processos de licenciamento ambiental, como se a lógica é de que o licenciamento ambiental atravanca o progresso, a consequência imediata é colocar este último à frente do primeiro, invertendo o que chamaríamos genuinamente de desenvolvimento.

Enquanto as abóboras não se ajeitam, poucos percebem que o foco, tanto da administração pública como da iniciativa privada, não deveria estar no licenciamento ambiental em si. 

Poucos se perguntam ao final das contas para que serve o licenciamento ambiental já que este causa tantos transtornos. A lógica da ignorância desenvolvimentista vai afirmar que ele está lá, tem que ser feito e pronto. É uma exigência do governo, mais uma forma de arrecadação, mais um dos tantos entraves ao desenvolvimento. Este equívoco é de ordem intelectual e por isso, indiretamente, demonstra o nível de inteligência do nosso povo.
Uma das queixas na demora do licenciamento ambiental que assola também outros tantos trâmites da administração pública municipal, estadual e federal é a famigerada burocracia. Para que tanta burocracia?
Vamos por partes...

Primeiro é preciso deixar claro aqui, que os servidores públicos, aqueles que trabalham para emitir a licença, também odeiam a burocracia tanto e, possivelmente, muito mais do que você. Ninguém gosta de burocracia. Ninguém quer burocracia. Mas infelizmente o empreendedor dispõe de uma criatividade ilimitada para tentar burlar qualquer coisa, seja vendendo a mesma terra três vezes, despejando resíduos industriais em áreas lindíssimas da natureza, captando água sem qualquer cuidado, despejando efluentes da mesma forma, comprando e vendendo madeira nativa sem qualquer controle, destruindo florestas essenciais à qualidade da água, contaminando tudo sem escrúpulos, dizendo uma coisa e fazendo outra, roubando identidades, forjando documentos, desrespeitando diretrizes e projetos, se vendendo à corrupção ou corrompendo, se apadrinhando, se comprometendo politicamente com o que é proibido por lei, se fazendo de leitão para mamar deitado, ou simplesmente posando de poderoso. Boa parte da papelama está lá hoje porque alguém como ele, algum dia e de alguma forma encontrou uma maneira de furar o esquema e tirar vantagem para si. Afinal, para que levar tudo tão a sério? Nesse trajeto o empreendedor aprendeu a fingir, mentir e gostar de suas habilidades de malandro que compartilha nos churrascos de fins-de-semana. Ninguém não se importa mais. A consequência desta malandragem é a construção monumental daquilo que hoje se reclama. A burocracia que todos temos que aguentar é em boa parte culpa da malandragem.

A administração pública, precisa primar pelo direito público e muito seria resolvido se se percebesse que estamos numa coletividade, e se incluísse nesta coletividade as plantas, os animais, o solo, a água e o ar, as pessoas que trabalham, as pessoas que compram as coisas que se vende, e as pessoas que contam com os seus serviços dependem. Todos querem menos burocracia. Bons eram aqueles tempos em que a palavra bastava. Hoje é preciso papel de muitos tipos e em várias vias, assinadas, carimbadas, reconhecidas, registradas, tudo isso com os nomes e os números verdadeiros e verificáveis daqueles que se responsabilizam pela informação, porque a bem da verdade bastaria o empreendedor ser responsável. Talvez, à medida que se mostra parceiro de algo muito maior que seu empreendimento, poderá a burocracia retroceder, mas acho difícil enquanto estiver em voga a "sabedoria" do empreendedor.
 

Se se conhecesse o único artigo da Constituição Federal, o artigo 225, que nos remete a nos organizarmos e nos disciplinarmos melhor nos norteando sob o princípio do desenvolvimento sustentável, onde: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações", então poderíamos afirmar que o desenvolvimento que precisa destruir tudo ao redor, não é desenvolvimento. Não adianta se orgulhar de trazer a empresa para este ou para aquele município sob o pretexto de gerar empregos. Em poucas gerações, tudo isso desmorona bem debaixo do nosso nariz (o nariz da coletividade), porque se exauriram os recursos. Os custos para reparar os danos desse descuido superam em muito os benefícios temporários. Isso já está claro entre os países e estados que inventaram o desenvolvimento. Não deveria adiantar nada ligar para o presidente, o diretor, o prefeito, ou quem quer que seja para reclamar do licenciamento ambiental, porque isso não fará do seu empreendimento um empreendimento inteligente. O compromisso o fará. Chantagear o prefeito ou o governador com ameaças de que vai se mudar para outro município ou outro estado, é no mínimo revelador de que o compromisso com o povo, que dirá com o meio ambiente onde este vive não existe. Só existe a fome de ganhar mais dinheiro e o resto que se dane.

Por isso o licenciamento ambiental está estabelecido: para preservar daqueles que não tem compromisso, o futuro de muitos amanhã.

 



 

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