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Tripulação em 6 maio 2014 às 16:58
Para entender a aviação no Brasil deve-se partir do seguinte: imagine-se dirigindo um BMW luxuoso no meio de um safári na África.
É mais ou menos assim que um aviador se sente voando no Brasil. Tem-se uma tecnologia de ponta no avião e um sistema precário e ultrapassado em volta.
Vou explicar: Os atrasos no Brasil têm características incomuns comparado aos do mundo afora; quando se tem nevoeiro... somente Guarulhos tem sistema mais preciso para pouso por instrumentos, conhecido como "ILS categoria 2". Curitiba também tem, mas lá colocam o sistema para manutenção exatamente em época de nevoeiro. Vergonhosamente Porto Alegre, Florianópolis e Confins não têm esse sistema. Estes sempre fecham por causa de nevoeiro.
Manaus, que tem uma localização extremamente estratégica e que sempre tem nevoeiro, porém também não tem sistema ILS.
Detalhe..."Nos EUA, são mais de 100 aeroportos só com ILS categoria 2", fora os de categoria 1 e 3.Se você, passageiro, está indo para Porto Alegre, saiba que seu avião não pode alternar Florianópolis, caso Porto Alegre esteja fechado.
Florianópolis tem um vergonhoso pátio para apenas cinco aviões; lembrando que no verão recebe mais 150 voos de fretamento além dos regulares.
Este aeroporto infelizmente não tem taxiway (pista para a aeronave taxiar até a pista principal), sendo necessário a aeronave taxiar pela pista principal gerando espaçamento maior entre as aeronaves que se aproximam, ocasionando atrasos.
Se você está chegando a São Paulo, o problema é parecido. Guarulhos está sempre com o pátio lotado, Vitória e Confins também. Galeão e Congonhas dias atrás ficaram nesta situação, com o pátio lotado.
Quem tinha Galeão como alternativa de pouso teve que escutar um "negativo" do controlador para alternar aquele aeroporto. Estava no plano de voo que Galeão seria o "alternado". Se o controlador aprovou o plano antes de decolar isso significa que é questão de lei e não de conveniência de pátio.
(Texto enviado por George Rocha, piloto e instrutor de vôo).
Voar no Nordeste é mais tranquilo por haver menor tráfego de aeronaves, porém há outro problema: O controle de tráfego tem o desserviço de contar com as aeronaves militares fazendo treinamento que geram atrasos, geralmente de mais de 20 minutos nas decolagens; O que desencadeia um atraso bem maior quando essas aeronaves chegam atrasadas ao sul do Brasil.
Na regra internacional uma aeronave em instrução militar tem preferência sobre aeronaves civis de passageiro em pousos e decolagens, porém, se o País quer adotar regras internacionais ao pé da letra...que construam bases militares específicas para a função militar.
Lembrem-se que aqui é Brasil e não Europa ou EUA, onde os aviões são sequenciados para pouso com separações de 4 km entre aeronaves, enquanto que no Brasil é de 8 km, e no caso de Florianópolis chega a 20 km, por falta de taxiway.
Todo piloto Brasileiro se sente mais seguro voando nos EUA, Europa e Ásia do que no Brasil, fato decepcionante, mas vou explicar o por quê...
No Brasil existe uma regra: "a menor distância entre dois pontos é uma curva". Você sabia que quando você sai do litoral brasileiro e vai pra São Paulo você voa em curva? É necessário passar por cima do Rio de Janeiro.
Poderia ser direto via Minas Gerais. Esse contorno do litoral gera em cada voo pelo menos 1000 litros a mais de combustível consumido.
Nos EUA já não existe mais aerovia, somente proa direta para o destino. Lá eles têm acordos com as ONGs e entendem que quanto menos tempo um avião ficar no ar menor é o efeito estufa.
Se fosse aqui seria o equivalente a você decolar de Salvador e o controlador autorizar proa direto de São Paulo. São 1000 litros de querosene desperdiçados, queimados na cabeça dos cariocas a cada 2 minutos.
"Deixe o Green Peace saber disso... A desculpa não pode ser separação de fluxo, já que os EUA são maiores que o Brasil, onde o fluxo aéreo é cinquenta vezes maior. O que o Brasil voa em horas, em 50 dias, os EUA voam o mesmo em apenas um dia.
Poderia ser pior. Se nevasse no Brasil a desorganização aérea seria uma catástrofe diária! Mas a culpa não é dos controladores. O sistema brasileiro é que é arcaico e precário. O salário deles é baixo e cheio de "concurseiros" sem compromisso com seu trabalho.
Alguns são sérios e dedicados porém não têm condições de trabalho dignas. Apenas um controlador cuida de várias regiões do País e todos sofrem muita pressão para, no final das contas, serem menos eficientes que os americanos, europeus e asiáticos.
Outro dia ouvi um controlador se despedindo no rádio porque tinha passado em um concurso melhor - isto é vergonhoso para um país que quer ser "primeiro mundo" - , mas desejei a ele sucesso e espero que ele esteja feliz no emprego bem remunerado que tem agora.
Eu, como piloto de linha aérea, digo, sem exagero, que voar no Brasil hoje é como voar numa espécie de alerta amarelo. Ao decolar não significa que temos a certeza de pousar no destino nem no aeroporto de alternativa. Outro dia cinco aeroportos estavam literalmente fechados por falta de pátio; Confins, Galeão, Vitoria, Guarulhos e Campinas.
Você tem que decolar de Brasília para São Paulo com combustível suficiente para alternar Salvador.
Isso irá tornar a aviação brasileira inviável, sem mencionar a venda de nossas companhias aéreas para países vizinhos, em decorrência das altas taxas de impostos sobre as mesmas, que para sobreviverem no mercado, submetem-se a parcerias miraculosas, inclusive mudando a sede da empresa para países vizinhos para se livrar dos impostos absurdos daqui.
Por que será? Porque aqui não há incentivo. Falta estrutura e lucidez.
A isso eu chamo de "Entregar a Soberania Nacional".
Voei muito na Amazônia e garanto que depois que aquilo virar um deserto ninguém mais vai querer assumir.
O desmatamento está na razão de um campo de futebol por segundo. Hoje só fazem hidrelétricas por causa do apagão de 2002. Esses apagões na aviação irão se repetir pelos próximos 20 anos.
E lembre-se que a Copa do Mundo e as Olimpíadas serão em época de nevoeiro.
A Infraero já arranjou duas soluções; tirar os bancos de suas "Rodoviárias" para dar mais espaço para os passageiros ficarem em pé, e liberar internet Wi-Fi de graça como se fosse um "cala-boca" para seus usuários.
Hoje a aviação brasileira é realmente uma surpresa diferente a cada dia, uma bagunça, como definiu um piloto europeu dias atrás.
Nos EUA, Europa e Ásia constroem um aeroporto para atender uma demanda que só terá daqui 20 ou 30 anos e com pátio suficiente para estacionar mais de 100 aviões de grande porte juntos.
Enquanto você lê esse e-mail, a Índia constrói mais de 10 aeroportos maiores do que o de Guarulhos. Na China são mais de 70 sendo construídos e os 3 países: China, Brasil e Índia fazem parte do mesmo grupo chamado "BRIC", que ainda incluem Rússia e África do Sul.
Parece que só o Brasil ainda não acordou entre esses cinco.
Já é um absurdo os aeroportos brasileiros não terem metrôs. Os estrangeiros, quando chegam aqui e não veem metrôs nos aeroportos, acham que é uma piada. Em qualquer aeroporto estrangeiro tem metrô.
O brasileiro se compara muito aos EUA, porém o povo americano sabe exigir de seus governantes, e o governo não espera ser pressionado para começar a fazer algo.
O povo brasileiro só sabe reclamar. Só não sabe reclamar para o órgão "competente". Quase ninguém entra no site do Senado ou da Câmara dos deputados para enviar e-mail reclamando do seu político ou para saberem o que estão fazendo.
É muito fácil ir aos Estados Unidos passear, fazer compras e voltar falando que lá é o máximo e aqui é o fim do mundo.
De fato são décadas de atraso, porém lá o povo é mais consciente com relação ao que seus políticos estão fazendo com o dinheiro público.
No Brasil a ANAC leva 30 dias para emitir uma carteira de aeronauta, gerando assim uma queda no salário dos pilotos e comissários e prejuízo também para os empregadores. Quem vai pagar essa conta? A Anac? O Governo Federal?
Nos EUA a mesma carteira é emitida em apenas uma hora pela FAA. Sem deixar de lembrar que no Brasil a ANAC administra um universo de 20 mil pilotos comerciais enquanto os EUA são mais de 600 mil.
Nos EUA poucos empregos no setor público têm estabilidade e talvez seja por isso o funcionário público trabalha mais, é mais eficiente e trata bem o contribuinte, mesmo um latino-americano.
Boa sorte a todos e que Deus nos proteja!
Antonio Carlos Cruzeta (piloto)
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