Adesões a programa que controla origem da madeira usada em obras públicas podem diminuir pressão sobre a Amazônia
Danielle Jordan
No dia 19 passado, ambientebrasil publicou matéria exclusiva falando sobre o anúncio do secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, José Goldemberg, segundo o qual aquele Estado iria editar um decreto exigindo o uso de madeira legalizada em obras públicas. Na ocasião, o jornalista Roberto Smeraldi, da ONG Amigos da Terra, teceu duras críticas à medida, diminuindo seu valor. “Se o Governo quisesse fazer algo diferente, tinha que exigir a madeira certificada”, disse então.
No domingo 5, em comemoração do Dia Mundial do Meio Ambiente, Governo de São Paulo e Prefeitura da capital anunciaram sua adesão ao programa “Cidade Amiga da Amazônia”, do Greenpeace, o que talvez se revele um avanço no sentido de minimizar as diferenças entre a madeira legalizada e a certificada. É que as administrações públicas se comprometem a adotar políticas de compra baseadas em Planos de Manejo Sustentável, aliando esforços no cumprimento da legislação ambiental, fiscalizada pelo Ibama e defendida pelo Greenpeace. “É um primeiro passo, uma mudança de comportamento”, diz Rebeca Lerer, coordenadora do Programa Cidade Amiga da Amazônia, explicando que, com os decretos do Estado e da Prefeitura de São Paulo, passará a ser exigida a ATPFs - Autorização de Transporte para Produto Florestal – como parte do processo de compra. Smeraldi, porém, mantém sua postura crítica e estabelece um paralelo entre a madeira legalizada e a certificada: “Em poucas palavras é a seguinte: a madeira legalizada/legal é aquela comercializada pelo pessoal que foi preso quinta-feira (02) em Mato Grosso, ou seja é madeira roubada de terras públicas que recebe um documento oficial em troca de propinas”, diz ele ressaltando a diferença. “A madeira certificada é aquela sujeita a uma auditoria de um órgão credenciado mundialmente que checa sua "cadeia de custódia", ou seja o caminho que ela faz desde a floresta até o varejo, de acordo com uma série de indicadores sociais e ambientais”.
Rebeca diz que o episódio ocorrido no Ibama na semana passada, - quando mais de 80 funcionários foram presos no Mato Grosso acusados de participar em um esquema de venda de documentos -, foi uma operação de fiscalização direto na fonte, para fins de controle. Ela faz um comparativo entre o tráfico de madeira e o tráfico de drogas. “O que é pego em fiscalizações é uma pequena porcentagem”.
Sabe-se que a madeira ilegal também chega a outros estados. Assim, para Rebeca, operações como a “Curupira” alertam para a necessidade de uma maior fiscalização, até mesmo dentro dos órgãos envolvidos.
Madeira legal
O Greenpeace exige, para participação no programa, que as administrações formulem leis municipais com exigência de critérios para compra ou contratação de serviços que utilizem madeira produzida na Amazônia. Entre esses critérios, estão a proibição do consumo de mogno, ameaçado de extinção; identificação da origem legal da madeira, com provas da cadeia de custódia; preferência à madeira certificada pelo FSC - Conselho Brasileiro de Manejo Florestal - ; além de orientar profissionais da área da construção civil quanto à utilização consciente da madeira nas obras. Manaus foi a primeira capital brasileira a assinar o acordo com o Greenpeace, no dia 03, comprometendo-se a banir o uso de madeiras de origem ilegais e predatórias, em obras públicas. Em São Paulo, municípios como Piracicaba, Botucatu, São Manuel e Conchas já aprovaram "leis em defesa da floresta" ao aderirem o programa “Cidade Amiga da Amazônia”. Agora a capital paulista também juntou-se ao grupo.
A ONG Amigos da Terra define o termo madeira 'legal” como produto explorado através de Planos de Manejo e transportado com autorização de transporte para produtos florestais (ATPF), emitidas pelo Ibama. Trata-se justamente do documento que vinha sendo “comercializado” pelo esquema de corrupção recentemente flagrado no órgão.
Marisa Simões, do Grupo Compradores de Produtos Florestais Certificados, da ONG Amigos da Terra, diz que a madeira legal pode ser oriunda de desmatamentos ou de manejo (de forma predatória por meio de autorizações de corte raso e falsificação de ATPF). “Normalmente a madeira é legal (ou "esquentada", como se diz informalmente) em alguma fase de sua cadeia de comercialização, mas para garantir sua origem e assegurar sua procedência, os Estados deveriam monitorar essa cadeia”, diz. “Ou então exigir em suas licitações públicas critérios que envolvam certificação de Cadeia de Custódia e Plano de Manejo Sustentável”.
Certificação
A certificação a que se referem os entrevistados é o selo FSC – Conselho Brasileiro de Manejo Florestal - que estabelece princípios e critérios para assegurar a origem da madeira desde o processo produtivo, respeitando o ciclo da floresta. “O selo serve para o consumidor reconhecer que o produto que ele está comprando não degrada o meio ambiente, assegura manutenção da floresta e combate a ilegalidade”, explica Marisa.
É, também, a garantia de uma exploração consciente e justa da madeira, atendendo necessidades sociais, ambientais e econômicas. O meio ambiente não sofre agressões pois tem o ecossistema preservado ao eliminar a prática predatória. A biodiversidade é preservada, assim como os recursos hídricos e do solo. Além do benefício ambiental, o selo garante os direitos e as condições aos trabalhadores e das comunidades locais. Smeraldi retoma a importância da certificação. “Existem alguns poucos estados e municípios - o Acre é um deles - que dão preferência à madeira certificada”, diz, afirmando que a exigência irrestrita não é possível em função da oferta insuficiente no mercado. “No momento, a única política possível é a de dar preferência, como forma de estimular os produtores a oferecerem mais”. Para o jornalista, a legislação de licitação não privilegia qualquer tipo de madeira e, sim, apenas o melhor preço. Ele sugere a inclusão nas leis de licitação de normas que aumentem a pontuação para quem oferece produtos que contenham determinadas características (colocando como características aquelas da certificação) e que sejam auditados por auditores credenciados por determinados órgãos, como o FSC.
Apesar do programa incentivar o uso de madeira certificada pelo FSC, Rebeca Lerer, coordenadora do “Cidade Amiga da Amazônia”, lamenta a inviabilidade de adotá-lo pela legislação, citando a Lei 8666/93, que trata das licitações e exige a livre concorrência. “O selo é o único que oferece garantias sócio-ambientais, incluindo o amparo à indústria, a sociedade. E mostrou credibilidade nos seus dez anos de história”. Ela comenta a existência de outro mecanismo de certificação, mas que ainda não possui reconhecimento e nem a mesma credibilidade. De qualquer forma, a exigência da certificação FSC nas licitações poderia caracterizar um monopólio.
Adesão ao programa “Cidade Amiga da Amazônia”
Piracicaba, Botucatu, São Manuel e Conchas, no estado de São Paulo, já estão com o programa em andamento. A capital recentemente assinou o termo de compromisso, estando com o projeto em fase de implantação. Sorocaba, São José dos Campos, Campinas, São Carlos, Bauru e Barueri também já aderiram formalmente ao programa. Em São Paulo, mais cidades devem iniciar as negociações como Guarulhos, Iperó, Jundiaí, Salto, São José do rio Preto e Ubatuba.
Manaus (AM) foi a primeira capital a aderir ao programa, que também está em fase de implantação.Os programa foi lançado também em outros estados, que logo devem iniciar as negociações, como Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Amapá.
Crédito da foto: Greenpeace/Russel Monk
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