4 de junho de 2005

DIA MUNDIAL DO MEIO AMBIENTE

Amanhã é o Dia Mundial do Meio Ambiente. Não há motivos de festas, pois estamos destruindo o nosso bem estar. Precisamos cuidar da mãe natureza e, em homenagem a ela, publico um artigo de Fernando Almeida para que nós nos conscientizemos da importancia que ela representa:

Mãe natureza: até quando?
Fernando Almeida

A educação e o desenvolvimento humanos, fundamentados na visão cartesiana clássica, aliados à crescente concentração urbana a partir principalmente de meados do século XX,definiram uma dicotomia entre a sociedade moderna e a natureza. A atitude de domínio e o uso indiscriminado dos recursos naturais ultrapassaram os limites na maioria dos casos e regiões.
Os ecossistemas devem ser analisados como provedores de serviços básicos à nossa sobrevivência: alimentos, água potável, madeira, fibra, recursos bioquímicos e genéticos, além de formação de solos, controle de enchentes, regulação do clima, reciclagem de nutrientes, assim como serviços culturais, incluindo religiosos, recreacionais, ecoturismo e educacionais, entre outros.
Como a história da Humanidade se confunde com o processo contínuo de alteração dos sistemas naturais na busca de padrões de vida mais elevados e materialistas, a capacidade natural de manutenção dos serviços dos ecossistemas citados, em sua maioria , vem decaindo.
Os europeus em busca do Pau Brasil e do açúcar deram partida à degradação da área de prestação de serviços da mata atlântica, maior biodiversidade do planeta, reduzida em 90 %. Da mesma forma, nas últimas duas décadas mais de um terço dos manguezais foram destruídos, incluído ai a pressão das fazendas de criação de camarão na América do Sul e Ásia. No continente asiático, coincidentemente, esta sendo constatada uma redução do impacto causada pelos recentes tsunamis em áreas onde os manguezais preservados serviram como barreiras naturais.
Rios importantes como o Amarelo, na China, o Nilo, no norte da África, e o Colorado, nos Estados Unidos, não chegam mais ao oceano em determinadas épocas do ano, degradando a fauna e flora marinha e empreendimentos produtivos correlatos. Apesar da crescente demanda, a atividade pesqueira vem decaindo desde os anos 80. A partir da introdução de processos industriais, o número de barcos tradicionais foi reduzido a menos de 10%. Espécies como Atum, Peixe Espada e Cação registram uma perda de 90%. Praticamente toda a indústria de beneficiamento de sardinha quebrou no Rio de Janeiro devido à sobrepesca.
Insumos básicos da agricultura, a presença de nitrogênio e fósforo nos ecossistemas mais do que duplicou a partir da década de 60. A carga dos nutrientes não incorporados à biomassa vegetal é arrastada para rios, lagos e oceanos, provocando em muitos casos a superfertilização, o que inviabiliza o uso da água para abastecimento público, aqüicultura, recreação, além da mortandade de peixes. Um exemplo típico é a represa de Guarapiranga, em São Paulo, com a cor verde inequívoca de um avançado estágio de eutroficação.
A globalização da natureza é outro vetor limitador dos serviços dos ecossistemas, sejam espécies dominadoras intercambiadas entre oceanos por águas de lastros dos grandes navios graneleiros, ou a introdução voluntária de espécies em outro habitat, como o caso dos porcos deixados em algumas Ilhas de Galapagos que devastaram a fauna local.
O serviço de captação de carbono na atmosfera pela fotossíntese das florestas em crescimento tem sido em muito superado pela emissão da queima de combustível fóssil , carvão, óleo e gás natural, determinando disfunção de corais, redução da biodiversidade fundamental na produção de novos medicamentos e cosméticos. Nevascas, enchentes e outras reações climáticas sem precedentes ameaçam com mais freqüência levar seguradoras à falência.
Finalmente, a miséria está intrinsecamente relacionada também à destruição dos ativos naturais. A comparação entre paises vizinhos em uma mesma ilha, Haiti e República Dominicana, enfatiza tal premissa. Ao destruir por completo sua cobertura vegetal, o Haiti se tornou os país mais pobre das Américas.
O prognostico, no médio e longo prazo, poderá ser outro se assumirmos - sociedade, governo e empresários - que os ativos e serviços devem ter valor, devidamente precificados, e são limitados. Devemos estar conscientes de que a gestão dos ecossistemas não pode ser restrita a uma área ambiental, seja no governo ou em uma empresa global. A inovação tecnológica jogará papel fundamental em um novo paradigma focado na perenidade dos serviços da natureza.
Os mercados paralelos - animais e madeira por exemplo - têm que ser anulados pelas convenções e leis nacionais, assim como boicote de compradores. A dimensão cultural terá função decisiva: mais do que o crescimento da população global, a mudança do estilo de vida determinará o grau de impacto e capacidade de sobrevivência dos ecossistemas e, por dependência, da própria Humanidade.
Estas e muitas outras considerações sobre o estágio atual dos ativos e serviços dos ecossistemas no mundo configuram o Millennium Ecosystem Assessment. Montado para informar aos tomadores de decisão e formuladores de políticas públicas sobre as conseqüências das transformações dos ecossistemas na qualidade de vida dos seres humanos, o programa contou com a colaboração de mais de dois mil cientistas de 100 paises, sob acompanhamento de um Comitê Executivo, formado por governos, agências da ONU, empresários e ONG's.
A conclusão deste programa inédito será lançada ao final deste mês de março de 2005, pelo secretário-geral da ONU, Kofi Annan, em Nova York e, simultaneamente, em Pequim, Nova Deli, Londres e outras grandes centros. No Brasil, o relatório do Millennium Ecosystem Assessment será apresentado oficialmente em Brasília pelo Governo federal e pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS).
Concretamente podemos afirmar que ainda há tempo para correção de rumo. Entretanto, as mudanças são culturais, estruturais, profundas e de curto prazo, visando a resultados perenes e contundentes. O desafio e a responsabilidade são únicos. O histórico capital ambiental inesgotável não passa, hoje, de uma metáfora anacrônica.

Fernando Almeida é presidente executivo do CEBDS e membro do Executive Board do Millennium Ecosystem Assessment


Assessoria de Imprensa do CEBDS

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