23 de outubro de 2008

Voto Nulo

O segundo dos artigos publicados no Quinta.
Desta vez sobre Voto Nulo.

Duciomar? Priante? Nulo?
Por Jefferson Teixeira (*)

A democracia representativa pressupõe a liberdade de escolha do eleitor quanto a seus representantes no parlamento ou no executivo. Apesar dessa liberdade de escolha, nas sociedades democráticas existem dois tipos de votos: o obrigatório que “é aquele em que a participação eleitoral não é deixada ao arbítrio do eleitor, mas assim determinada por lei que assim prevê sanções no caso de não-cumprimento”, conforme palavras do cientista político Cícero Araújo; e o facultativo, onde o eleitor não sofre qualquer tipo de sanção legal ao se eximir de participar do processo de escolha de seus representantes.
No Brasil, uma regra que parece ser intocável à legislação eleitoral é o caráter obrigatório do voto, adotado desde os tempos getulistas, precisamente desde 1934. As razões a favor ou contra o voto obrigatório, continua Cícero Araújo, podem ser classificadas em dois tipos:
a) “questões de princípio (que levam em conta o significado e o estatuto mesmo do ato de votar)” ,
b) “razões prudenciais (que consideram os efeitos benéficos ou danosos da obrigatoriedade ou não da participação)”.
Se o voto é um direito ele deveria ser obrigatório? Dentro dessa questão surge o seguinte conflito: temos um direito e somos livres para exercê-lo ou não; ou somos compelidos por uma legislação a votar, assim o voto torna-se uma obrigação.
Faço essa introdução, pois, mesmo ausente de dados empíricos, considero o voto obrigatório uma variável importante para explicar o voto nulo, mesmo quando esse não alcança índices que possam definir o resultado final. Destarte levanto pelo menos duas questões que aqui merecem ser expostas:
- Num processo eleitoral, em que o voto fosse facultado, onde uma parcela do eleitorado não se identificasse com as propostas de nenhum dos candidatos e/ou partidos que competem, esses eleitores se dariam ao trabalho de saírem de suas residências até suas respectivas seções de votação simplesmente pelo fato de ali manifestar seu protesto?
- Num sistema de obrigatoriedade, o eleitor compelido a votar e sem identificar-se com os candidatos e/ou partidos em disputa não iria anular seu voto, tendo em vista que essa é uma alternativa dada pela urna eletrônica e, não muito tempo atrás, pela “nada saudosa” cédula eleitoral (quem não lembra a dificuldade de interpretar os nomes escritos nas cédulas pelos eleitores menos instruídos nos votos para os parlamentares?)?.
Outra questão não menos importante deve-se ainda a dificuldade de muitos eleitores em dominarem a urna eletrônica, o que pode resultar numa opção de voto nulo contra suas vontades e não tão menos numerosa.
Em Belém, o percentual de voto nulo atingiu os 4,57% na eleição para prefeito e 5,10% na eleição para vereador, não se diferenciando muito da média nacional e do que ocorreu em nosso estado no dia 5 de outubro. Entretanto, os candidatos que disputarão a cadeira principal do poder executivo carregam em seus currículos variáveis que podem determinar o voto nulo: um carregou durante 4 anos um alto índice de rejeição (caso do atual prefeito que busca a reeleição); outro tem o apoio de Jader Barbalho, o que para o eleitor belenense isso pode ser um motivo para ser rejeita-lo expressivamente. Isso explicaria o índice de votos nulos que muitos imaginam ser alto no próximo domingo? Se considerarmos os três últimos pleitos, onde “Vermelhos” e “Amarelos” polarizaram a disputa municipal, onde a escolha do eleitor ganhava contornos partidário-ideológicos, e esse eleitor se sentia um provável decisor, podemos dizer que sim. Porém, acredito que o mesmo não atinja uma marca que definirá o resultado do pleito. Diferentemente se somarmos os votos brancos, nulos e as abstenções: aí sim poderemos ter um percentual decisor.
Hoje o debate partidário-ideológico e da forma como gestar a cidade foi susbstituídos por discursos vazios, que não alcançam o imaginário do eleitor: é o candidato “eu fiz e vou fazer mais”, contra o candidato “ele não fez e não vai fazer”. Tal debate, ou a ausência de um debate que resulta numa política propositiva que resolvam problemas (que se tornaram “não tão básicos” mas urgentes) para a população de Belém pode ser uma saída protestante para o eleitor.

Alguns pensadores anarquistas defendem a idéia de que o voto nulo é um voto libertário, anti-sistema e contra o estado. A posição de quem é de esquerda é que na falta de alternativa o voto nulo seria um ato libertador-revolucionário, contra candidatos que representam interesses de classe dominante.Num célebre ensaio sobre o governo representativo quando afirma que “o voto deveria ser um ato de confiança”,John Stuart Mill, acrescenta ainda que “ se o sufrágio é um direito, se pertence ao eleitor em seu próprio benefício, com que base poderíamos culpa-lo por vende-lo, ou usa-lo para recomendar a si próprio a quem seja de seu interesse agradar?”
Sem anarquismo ou esquerdismo, defendo a idéia de que o voto nulo é um ato consciente do eleitor que obrigado a participar de um pleito procura maximizar os ganhos e reduzir os custos. No caso do voto nulo a maximização dos ganhos seria não votar num governante que não atenderia suas demandas e da grande maioria da população.

A redução dos custos seria não carregar em sua consciência moral o fado de ter contribuído com seu voto a eleger um governante que não considerou os valores éticos e morais que devem fazer parte do mundo político.


(*) Cientista Político, Especialista em Partidos e Eleições na Democracia Contemporânea e Mestrando em Ciência Política na Universidade Federal do Pará

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