6 de janeiro de 2010

Tragédia Evitável

Passados alguns dias da tragédia anunciada em Angra dos Reis, as autoridades correm para proibir construções, provocar demolições, doar genêros alimentícios/roupas e discutir o que aconteceu.

Há anos, desde quando foi colocado em prática o Estatuto das Cidades tenta-se incluir uma cláusula para que as cidades de risco geológico-geotécnico tenham uma Carta Geotécnica (proposta do geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos). Ele sugere o seguinte:
"Uma medida paralela seria batalhar por recursos  financeiros estaduais e federais em apoio aos municípios que não tem recursos  próprios para a contratação da execução de sua Carta Geotécnica. Essa contratação seria feita com Universidades, Institutos e Empresas Privadas  capacitadas à elaboração do referido documento  cartográfico".
Ninguém nem se preocupou em discutir o tema.

Todos sabem que as construções estabelecidas em fundo de vales, nas desembocaduras dos rios ou em encostas com declividade acentuada correm riscos de sofrer/provocar desastres que denominam "natural". Por que não evitar as construções em cidades cujo território possua um relevo montanhoso acidentado e que não tenham um documento cartográfico que lhes indique áreas que de forma alguma possam ser ocupadas e áreas que possam ser ocupada desde que obedecidos rígidos critérios técnicos adequados às situações geológico-geotécnicas?

Assim nada mais justo que produzir, através de profissionais competentes, os planos para evitar estes desastres, que tornam-se mais caros para os governos que a simples negativa - e a consequente derrota eleitoral -  de construção, nestes locais inadequados, de moradias ou locais de hospedagem.
Alguns colegas compartilham da opinião abaixo: 

Mesmo com esses planos diretores de geologia urbana bem estruturados e técnicamente perfeitos, se houver interferências político-eleitoreira-partidária na implementação e fiscalização nada vai mudar.
Imagine a "corrosão no patrimônio eleitoral" de um prefeito se ele resolver impedir a ocupação desordenada de um fundo de vale ou de uma encosta de alta declividade ou então agira na remoção ? A oposição cairá de pau alegando que os coitados tem o direito de permanecer por alí, não lembrando que é uma zona de risco de inundação ou de escorregamento. Se o previsível evento catastrófico ocorrer com soterramentos e mortes, a oposição cairá de pau no prefeito de plantão cobrando as ações preventivas que ela mesma impediu de serem implementadas.
Lamentavelmente, é verdade que muitos dos nossos gestores não querem saber de uma ou outra opinião técnica para evitar desastres e mortes. Para muitos deles é mais vantajoso doar milhares de reais em medicamentos, roupas e artigos de primeira necessidade do que prever o dano material e sentimental causado e perfeitamente evitável.
Não podemos deixar acontecer tragédias como essas:



Um comentário:

Carlos Faria disse...

A questão é muito pertinente e de difícil implementação, tanto aí como aqui, pelos motivos que estão bem patentes no post.
Quando na sequência do sismo de 9 Julho de 1998 a minha freguesia rural e outras zonas da ilha do Faial foram destruídas, os problemas geológicos vieram ao de cima no planeamento da reconstrução.
Como geólogo estava consciente da situação, pelo que apoiei de imediato as iniciativas públicas nesse sentido e inclusive integrei a equipa de técnicos encarregues de elaborar a carta de riscos para a ilha do Faial.
Como presidente da junta de freguesia que também era, pelo maior partido da oposição à câmara e ao governo, consegui que os dois lados da barricada pudessem implementar o reordenamento da Ribeirinha sem grandes lutas... infelizmente, noutras localidades a coisa foi gerida mais politica que tecnicamente e riscos foram por vezes ignorados.
Depois com o passar dos tempos a situação voltou ao normal e já se vêem cada vez mais autorizações em locais de maiores riscos. Até um dia...